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Redução da maioridade penal é ineficaz no combate às causas da violência

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Na última quarta-feira (19), a Câmara dos Deputados aprovou, em segundo turno, a proposta que permite que adolescentes com mais de 16 anos sejam punidos como adultos em casos de homicídio doloso, lesão corporal seguida de morte e crimes hediondos. O texto segue agora para o Senado, onde precisará passar por duas votações e pode sofrer novas alterações.

A redução da maioridade penal é apontada por seus defensores como única saída para resolver o complexo problema do aumento da violência no país. Entretanto, a proposta desconsidera por completo as causas sociais que produzem essa situação. Aposta apenas na ampliação do já falido e superlotado sistema prisional brasileiro, sem analisar que a violência e a falta de segurança pública estão relacionadas com a estrutura desigual e excludente da nossa sociedade.

A medida propõe aumentar o encarceramento, sem considerar que os presídios são ineficazes na recuperação de detentos. Muitas prisões são controladas por facções e funcionam como verdadeiras ‘escolas do crime’. Hoje, o sistema prisional tem um nível de reincidência de mais de 70%. Enquanto as medidas socioeducativas têm uma reincidência menor, em torno de 20%.

Além disso, não há qualquer comprovação de que a redução da maioridade penal diminua realmente a criminalidade. O exemplo dos Estados Únicos é didático. Nos anos 1990, 47 dos 50 estados americanos ampliaram as penas para menores infratores. Na última década, o país tem feito o movimento contrário. Segundo a ONG americana Campaign for Youth Justice, desde 2005, 29 estados americanos e a capital Washington aprovaram leis que tornam mais difícil processar e punir adolescentes como se fossem maiores de idade. A mudança nos EUA ocorreu após estudos mostrarem que prender menores de idade não tinha efeito considerável nos índices de criminalidade.

Não conquistaremos avanços significativos para o problema da falta de segurança enquanto o poder público propor apenas medidas de caráter punitivo que, ao invés de prevenir, agem depois que o crime foi feito. Os jovens que serão atingidos pela redução da maioridade penal são, em sua maioria absoluta, filhos de trabalhadoras e trabalhadores pobres sem acesso ao básico para viverem com dignidade. Jovens que pela situação de miséria em que vivem acabam abandonados nas mãos do crime organizado desde muito cedo.

A miséria que produz a criminalidade não se modifica com a construção de mais presídios ou com encarceramento mais precoce dos jovens. Por isso, não basta investir apenas na resolução dos “sintomas” da violência. É preciso agir nas causas sociais que empurram uma parcela cada vez maior de meninos e meninas para o mundo do crime: desigualdade social, miséria, falta de acesso à educação, saúde e trabalho.

A direção do SISMMAC manifesta sua posição contrária à redução da maioridade penal. Ao mesmo tempo em que esse debate é feito no Congresso, o governo federal reduz o investimento em educação, medida que apenas fragiliza as iniciativas que hoje funcionam como rede de apoio para os jovens em situação de vulnerabilidade social.

Projeto aprovado na Câmara propõe criar estabelecimentos exclusivos para jovens de 16 e 17 anos que cometeram crimes graves
A proposta aprovada na Câmara dos Deputados prevê que os jovens de 16 e 17 anos que cometeram crimes graves cumpram pena em estabelecimento exclusivos, separados dos adolescentes em medidas socioeducativas e dos adultos com mais de 18 anos.

Entretanto, vários estados brasileiros têm dificuldade de manter instituições para adolescentes infratores hoje. O receio é que, na prática, os adolescentes fiquem em prisões comuns junto dos adultos, mas em alas separadas. Essa separação apenas formal não evitaria o contato com presos de facções criminosas.

Segundo pesquisa divulgada, em junho, pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), o percentual relativamente baixo de jovens que cometem crimes contra à vida também dificultaria a criação de um sistema exclusivo. Dos 25.192 delitos praticados por adolescentes em 2013, 4.087 (16,23%) foram considerados graves e incluídos na proposta que está em debate no Congresso. A média é de 145 menores “enquadrados” na redução da maioridade penal por estado brasileiro.

Os dados também demonstram que os adolescentes hoje são muito mais vítimas de violência do que autores. Dos 21 milhões de brasileiros entre 12 e 18 anos incompletos, apenas 0,013% cometeram crimes contra a vida. Mas a cada hora um adolescente é assassinado. Neste quesito, o Brasil só perde para a Nigéria.

Interesses econômicos por trás da redução da maioridade penal
Algumas semanas antes de a Câmara aprovar a redução da maioridade penal em primeiro turno, com a manobra do presidente Eduardo Cunha (PMDB-RJ), o deputado Rogério Rosso (PSD-DF) apresentou um projeto de lei que sugere a criação de “Centros de Ressocialização Juvenil” por meio de Parceria Público-Privada (PPP).

Na verdade, a redução da maioridade penal também busca criar um novo filão de mercado para as empresas de segurança privada, que esperam lucrar com a privatização do sistema penitenciário.

Muitos parlamentares favoráveis à redução da maioridade penal são ligados a empresas de armamento e segurança privada. A reportagem da Agência Pública, realizada em maio deste ano, mostrou que as empresas que atuam na área de gestão prisional ajudaram a financiar as campanhas de pelo menos quatro deputados na Câmara: Bruno Covas (PSDB-SP), o pastor evangélico João Campos (PSDB-GO), Silas Câmara (PSD-AM) e Felipe Maia (DEM-RN).

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